Sem que ele sequer soubesse tornou-se a fonte dos desejos dela. Ele era o cara por quem ela esperara há anos. Mas alguém já havia resolvido encontrá-lo antes dela, que dor sentia no peito ao lembrar daquilo! O pior é que ela conhecia a moça que enfeitiçara seu deus grego, sua perdição na Terra, embora tivesse a certeza de que ele seria a sua redenção, a sua salvação daquela vidinha chata e sem novidade com a qual convivia. Sempre quis e muito viver um grande amor, por isso amava os versos de Moraes com a "receita" para desfrutar de um, mas infelizmente tudo ficava só em sua mente e em seus sonhos... Pelo menos sonhar é permitido. Repetia para si os versos do poetinha "para viver um grande amor preciso é muita concentração e pouco siso, muita seriedade e pouco riso", mas como viver os versos imortais do poeta das paixões? Como? Como? Eram sempre as perguntas que tumultuavam sua cabeça cheia de dúvidas e com uma certeza: desejava aquele homem, o queria para si e mais ninguém...
Ele? Ele sequer sabia dos desejos mais loucos e ardentes que pulsavam no corpo e habitavam a mente dela. Quando a via, era muito simpático, mas do mesmo modo o fazia com as outras mulheres. Decidiu então ir à luta e vencer a peleja por ela criada. Fantasiou como seria o primeiro olhar de amor dos dois, seu corpo ficou todo arrepiado, todo ouriçado por aquilo. Vestiu-se todos os dias para causar nele o impacto que planejava em seus longos e deliciosos devaneios noturnos. Maquiava-se religiosamente de acordo com o que supunha que ele gostasse de ver em uma mulher. Coloria-se para ele, bordava-se para ele, vivia para ele.
E um dia abriu o livro do poetinha, ou melhor, do poetão que amava amar do mesmo modo como ela vivia o amor que julgava estar sendo vivido, e lendo seus versos de amores vividos, consumados e findados percebeu que algo estava errado em seu filme a la Wood Allen concebido e interpretado por ela há tanto tempo... Sentiu um nó na garganta e lágrimas escorreram-lhe pelo rosto sem que ela entendesse se aquilo era por amar ou por descobrir ter amado durante tanto tempo sozinha. Entristeceu-se e enlutou-se por aquele lindo amor ter chegado ao fim, ao menos pra ela havia acabado.
Quando o sol raiou e a despertou, ainda trôpega e meio atordoada por tanto chorar, resolveu caminhar, mas uma mensagem matinal a obrigou a se banhar, um amigo precisava com ela desabafar e quem sabe seria ele um bom ouvinte de seus problemas? Por que não falar pra ele que o amor lhe dera as costas e ingrato a abandonou?
Assim que o viu, achou estranho o seu olhar, mais estranho ainda era o livro que tinha em mãos "Para viver um grande amor". Sorriu. Caminhou e concluiu parafraseando seu poeta predileto "Mas tudo isso não adianta nada, se nesta selva escura e desvairada não se souber achar a(o) bem-amada (o) - para viver um grande amor."